sábado, 8 de setembro de 2012

Documentos sobre o Regime Militar


1-      Judas – o Dedo duro

De todas as violências e ilegalidades postas em pratica pela quartelada de 1o de abril, a mais repugnante, a mais abjeta é a oficialização e a santificação da delação(...).
(...)Delatar um colega de trabalho, aponta-lo aos algozes de hoje porque ele pensa diferente de nós – não é um ato digno de um homem, e muito menos de um democrata. A oficialização da delação é a arma predileta e inseparável dos regimes de força. Quem melhor se utilizou dela foram nomes recentes para o nosso repúdio: Hitler, Mussolini.
Mas é preciso que haja resistência. Os inquisidores irão embora, a inquisição passará. Mas ninguém esquecerá o delator, ninguém perdoará a delação. Lembro o símbolo universal da Traição: Judas .(...)
CONY, Carlos Heitor. Judas – o dedo-duro. Correio da Manha, 14 de maio 1964.

 

2-      A tortura durante o regime militar(1969)

(...)alguns métodos de tortura consistem na aplicação de choques elétricos em várias partes do corpo, inclusive órgãos genitais e até na língua; no “telefone”(tapas simultâneos nos ouvidos); no “pau-de-arara”(onde a vítima é amarrada e espancada); as pancadas nas plantas dos pés, que raramente deixam marcas; a prisão em “surdas”, que são solitárias de 2 m por 1,20 . Outras violências consistem em deixar presos políticos em celas congestionadas com presos comuns e submeter a interrogatórios  que devem chegar até quarenta horas seguidas. Outros suplícios são o “caldo”, que consiste em submergir o preso ou quase sufoca-lo com grande quantidade de águas nas narinas(...).
Veja, n.65, 3 dez.1969, p.23

3-      O governo responde sobre a tortura(1970)

Há “uma campanha difamatória montada(...) por aqueles que não se conformam  com o desenvolvimento brasileiro(...). Paradoxalmente(...) quanto mais acelera o país sua taxa de crescimento, aumentando exportações(...), construindo escolas e hospitais, observa-se que mais se acentua a atividade soez(vil) de denegrimento do Governo. (...) Não há tortura em nossas prisões. Também não há presos políticos. (...) Há porém, terroristas(...), que respondem a processo regular pelos crimes que praticaram, matando pessoas indefesas, assaltando bancos e particulares e seqüestrando diplomatas.”
NOTA oficial do governo, 9 de maio de 1970.

 


Músicas de Protesto

4-  Cálice


Pai, afasta de mim esse cálice
Pai, afasta de mim esse cálice 
Pai, afasta de mim esse cálice
De vinho tinto de sangue
REPETE
Como beber dessa bebida amarga
Tragar a dor, engolir a labuta
Mesmo calada a boca, resta o peito
Silêncio na cidade não se escuta
De que me vale ser filho da santa
Melhor seria ser filho da outra
Outra realidade menos morta
Tanta mentira, tanta força bruta
REPETE
Como é difícil acordar calado
Se na calada da noite eu me dano
Quero lançar um grito desumano
Que é uma maneira de ser escutado
Esse silêncio todo me atordoa
Atordoado eu permaneço atento
Na arquibancada pra a qualquer momento
Ver emergir o monstro da lagoa
REPETE
De muito gorda a porca já não anda
De muito usada a faca já não corta
Como é difícil, pai, abrir a porta
Essa palavra presa na garganta
Esse pileque homérico no mundo
De que adianta ter boa vontade
Mesmo calado o peito, resta a cuca
Dos bêbados do centro da cidade
REPETE
Talvez o mundo não seja pequeno
Nem seja a vida um fato consumado
Quero inventar o meu próprio pecado
Quero morrer do meu próprio veneno
Quero perder de vez tua cabeça 
Quero cheirar fumaça de óleo diesel
Me embriagar até que alguém me esqueça

5-  Apesar de Você


Hoje você é quem manda, falou, tá falado, não tem discussão, não
A minha gente hoje anda falando de lado e olhando pro chão, viu
Você que inventou esse estado e inventou de inventar toda a escuridão
Você que inventou o pecado esqueceu-se de inventar o perdão
Apesar de você, amanhã há de ser outro dia
Eu pergunto a você onde vai se esconder da enorme euforia
Como vai proibir quando o galo insistir em cantar
Água nova brotando e a gente se amando sem parar
Quando chegar o momento, esse meu sofrimento vou cobrar com juros, juro
Todo esse amor reprimido, esse grito contido, esse samba no escuro
Você que inventou a tristeza, ora, tenha a fineza de desinventar
Você vai pagar e é dobrado cada lágrima rolada nesse meu penar
Apesar de você, amanhã há de ser outro dia
'Inda pago pra ver o jardim florescer qual você não queria
Você vai se amargar vendo o dia raiar sem lhe pedir licença
E eu vou morrer de rir, que esse dia há de vir antes do que você pensa
Apesar de você
Apesar de você, amanhã há de ser outro dia
Você vai ter que ver a manhã renascer e esbanjar poesia
Como vai se explicar vendo o céu clarear de repente, impunemente
Como vai abafar nosso coro a cantar na sua frente
Apesar de você
Apesar de você, amanhã há de ser outro dia
Você vai se dar mal, et cetera e tal, laraia, laraia ...

6- Meu caro amigo

Meu caro amigo me perdoe por favor
Se não lhe faço uma visita
Mas como agora apareceu um portador
Mando notícias nesta fita
Aqui na terra tão jogando futebol
Tem muito samba, muito choro e rock'n roll
Uns dias chove noutros dias bate sol
Mas o que eu quero é lhe dizer
Que a coisa aqui está preta
Muita mutreta pra levar a situação
Que a gente vai levando de teimoso e de pirraça
Que a gente vai tomando que também sem a cachaça
Ninguém segura esse rojão
Meu caro amigo eu não pretendo provocar
Nem atiçar suas saudades
Mas acontece que eu não posso me furtar
A lhe contar as novidades
É pirueta pra cavar o ganha-pão
Que a gente vai cavando só de birra, só de sarro
E a gente vai fumando, que também sem um cigarro
Ninguém segura esse rojão
Meu caro amigo eu quis até telefonar
Mas a tarifa não tem graça
Eu ando aflito pra fazer você ficar
A par de tudo que se passa
**Refrão**
Muita careta pra engolir a transação
E a gente tá engolindo cada sapo no caminho
E a gente vai se amando, que também sem um carinho
Ninguém segura esse rojão
Meu caro amigo eu bem queria lhe escrever
Mas o correio andou arisco
Se me permitem vou tentar lhe remeter
Notícias frescas neste disco(...)
 

7- Roda Viva


Tem dias que a gente se sente
Como quem partiu ou morreu
A gente estancou de repente
Ou foi o mundo então que cresceu
A gente quer ter voz ativa
No nosso destino mandar
Mas eis que chega a roda viva
E carrega o destino prá lá ...
Roda mundo roda gigante
Roda moinho, pião
O tempo rodou num instante
Nas voltas do meu coração
A gente vai contra a corrente
Até não poder resistir
Na volta do barco é que sente
O quanto deixou de cumprir
Faz tempo que a gente cultiva
A mais linda roseira que há
Mas eis que chega a roda viva
E carrega a roseira prá lá
A roda da saia mulata
Não quer mais rodar não senhor
Não posso fazer serenata
A roda de samba acabou
A gente toma a iniciativa
Viola na rua a cantar
Mas eis que chega a roda viva
E carrega a viola prá lá
O samba, a viola, a roseira
Um dia a fogueira queimou
Foi tudo ilusão passageira
Que a brisa primeira levou
No peito a saudade cativa
Faz força pro tempo parar
Mas eis que chega a roda viva
E carrega a saudade prá lá ...

Alegria, alegria

Caminhando contra o vento,
Sem lenço, sem documento
no sol de quase dezembro eu vou.
O sol se reparte em crimes,
espaçonaves, guerrilhas,
em Cardinales bonitas, eu vou.
Em caras de presidentes,
em grandes beijos de amor
Em dentes, pernas, bandeiras,
bomba e Brigite Bardot
O sol nas bancas de revistas
me enche de alegria
e preguiça, que lê tanta notícia, eu vou.
Por entre fotos e nomes
os olhos cheios de cores
o peito cheio de amores vãos.
Eu vou, por que não? Por que não?
Ela pensa em casamento
eu nunca mais fui à Escola
Sem lenço, sem documento, eu vou.
Eu tomo uma coca-cola
ela pensa em casamento
E
uma canção me consola, eu vou.
Por entre fotos e nomes
sem livros e sem fuzil
sem fome, sem telefone
no coração do Brasil
Ela nem sabe até
pensei em cantar na televisão
O Sol é tão bonito,
eu vou sem lenço, sem documento,
nada no bolso ou nas mãos.
Eu quero seguir vivendo amor!
Eu vou, por que não?
Por que não?
Por que não?...

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