sexta-feira, 12 de julho de 2013

Imoral para quem?

Negras vendiam o corpo para obter benesses, escandalizando
os estrangeiros, mas nas culturas africanas o sexo tinha outros significados

Sheila de Castro Faria

“Cada vez que eu falar da negra, é sempre a negra mina [oriunda da África ocidental ]. Por pouco que se possua do sentimento de verdade, o homem que habita a zona equatorial não pode recusar a sua admiração por essas soberbas criaturas, cujo porte está cheio dessa majestade radiosa que o
elogio atribui às rainhas, e a poesia às deusas.”

Embora não tenha sido o único a destacar a beleza das mulheres negras do Brasil, o francês Charles Expilly foi um dos poucos estrangeiros a declarar tão explicitamente o seu deslumbramento pela “majestade radiosa” de sua figura e a compará-las a rainhas e a deusas. O trecho foi publicado em
meados do século XIX, no livro Mulheres e costumes do Brasil . Mas, mesmo fascinado pelas formas, o francês lhes criticava os costumes. Em suas palavras, eram criaturas de “mal viver”, pois adoravam joias e vendiam o corpo para consegui-las.

Causava estranheza a esses observadores ver metais e pedras preciosas em corpos negros, numa sociedade em que a condição escrava era a pior de todas. Para eles, somente a prostituição poderia justificar tal conquista. E essa visão era antiga. No início do século XVIII, o jesuíta Antonil recriminava
a suposta forma de como muitas escravas conseguiram sua liberdade: a venda do corpo, associada à indumentária e aos adereços que portavam. “A maior parte do ouro, que se tira das minas, passa em pó e em moedas para os reinos estranhos e a menor é a que fica em Portugal e nas cidades
do Brasil, salvo o que se gasta em cordões, arcadas, e outros brincos, dos quais se vêm hoje carregadas as mulatas de mal viver e as negras, muito mais que as senhoras”.

Rosa Egipcíaca, em documento datado de 1752, descreve as visões celestiais que passou a ter, alegando que “se desonestava vivendo como meretriz, tratando com qualquer homem secular que a procurava, em cuja vida andou até o tempo que teve o Espírito Maligno”. O motivo para andar “desonestada” era o fato de sua senhora não lhe fornecer as roupas e os enfeites que solicitava, por isso ela os conseguia “em prêmio de sua sensualidade”.

O montante do prêmio, obviamente, variava de mulher para mulher. Algumas angariaram quantias relativamente expressivas. No livro Os desclassificados do ouro, a historiadora Laura de Mello e Souza cita o caso de um proprietário de Minas que, em 1754, lucrava semanalmente uma oitava e meia de ouro com a atividade de apenas uma prostituta. Não era pouca coisa: cada oitava valia 1$200 (mil e duzentos réis). O preço de um escravo jovem era de cerca de 100$000 (cem mil réis), ou seja, a cada ano, esse senhor podia comprar um novo escravo através do “prêmio da sensualidade” de sua escrava.

Outro estrangeiro que relatou seu contato com mulheres negras foi o médico austríaco Johann Emanuel Pohl. No início do século XIX, visitava a cidade de São João Del Rey quando “duas negras jovens” entraram em seu quarto de hospedaria para vender frutas em conservas. Mas suas atitudes e olhares
revelavam “claramente qual era sua verdadeira ocupação”. Mandou que as negras saíssem. Quando se distraiu, uma delas pegou algo de um baú e dele retirou um pacotinho de sementes, deixando-o cair. Nenhuma delas mostrou embaraço com a tentativa do furto. Ao contrário, deram muitas risadas.
Para o visitante, o episódio evidenciava “o quanto é descurada aqui, moralmente, a classe baixa”.

Católicos ou protestantes, os estrangeiros se espantavam com a prostituição e o “mal viver”. Seda e ouro em corpos cuja cor indicasse a escravidão eram emblemas claros, para eles, da sedução e da perversão de costumes no Brasil. Para os cristãos, a virgindade e a fidelidade conjugal eram premissas
fundamentais, mesmo que nem sempre concretizadas. Trocar sexo por joias, dinheiro ou qualquer outro benefício era por eles tido como meretrício.

Mas como os escravos e as escravas vindos da África compreendiam essas mesmas práticas? Há pouquíssimos estudos sobre a sexualidade dos povos africanos que se tornaram escravos na América, e eles eram originários de
diversas culturas, com padrões de comportamentos sexuais muito heterogêneos. Não podemos saber com certeza de seus tabus ou permissões relativos à prática sexual. Mas é possível fazer algumas suposições.

Na cultura ocidental, era comum o sistema de sucessão pela via paterna, fosse de cargos, de fortuna, de bens, de situação  social, de nome ou de “casa” (no sentido de nobreza). Por isso, prescrever a virgindade das noivas e esposas era fundamental para a certeza de que os herdeiros seriam filhos ou filhas do pai. Nem sempre se conseguia, é verdade, mas era este o princípio. “Filho de minha filha meu neto é; filho de
meu filho é meu neto ou não é?”, dizia o ditado.

Nas sociedades africanas, os sistemas de herança ou de sucessão variavam muito. Havia sociedades em que os reis ou chefes eram escolhidos por um conselho. Em outras, a linhagem paterna era preferencial. E em grande parte delas o sistema era matrilinear, ou seja, era a mãe que determinava a
linhagem. O filho da irmã era o escolhido como herdeiro ou sucessor. Em geral, o pai não fazia diferença, pois a pessoa teria o sangue da mãe.

Esta regra se referia a reis, nobres e chefes. Quanto à população comum, de camponeses, artesãos, pescadores e caçadores, por exemplo, há pouca informação. Mas tudo indica que o sistema matrilinear imperava em quase todos os extratos da sociedade. Ser “filho da mãe” era condição fundamental para estar inserido na comunidade. Testemunhos de alguns ocidentais reforçam a ideia de que a virgindade e a fidelidade conjugal não eram normas compactuadas por algumas sociedades. Outra diferença marcante: casamento e procriação não tinham relação direta para homens e mulheres nascidos na África. Ao longo do século XVII, na Cúria Metropolitana do Rio de Janeiro, numa amostragem de 77 testamentos de mulheres alforriadas nascidas na África ocidental, constatou-se que 29 delas eram casadas e, dessas, nove eram mães, mas somente uma delas tinha filho do marido. As outras afirmavam que seus filhos eram de outros pais. Nitidamente, o casamento não representava, para elas,condição fundamental para ter filhos. Muito menos a virgindade era importante para os homens que as desposavam.

“Para eles, a honra de uma mulher não é ofuscada pela variedade de seus amores nem pelo número de amantes, desde que reconheça o seu marido como amante principal”, registrou o padre Antonio Cavazzi de Montecúccolo, em missão na África Central, mais especificamente em Congo,
Matamba e Angola, no final do século XVII. Em 1692, o padre Girolamo Merolla também anotou que as mulheres da África central preferiam não se casar com seus parceiros sexuais. São testemunhos pouco confiáveis: esses missionários tinham preconceitos arraigados e claramente os demonstravam a partir de juízos de valor.

Também não é o caso de simplesmente associar as práticas sexuais dessas mulheres no Brasil aos costumes corriqueiros em suas sociedades de origem. Elas podiam, inclusive, estar transgredindo normas de suas culturas, pois estavam fora de suas terras, longe de sua gente. Na diáspora, criaram novas regras, inclusive sexuais.

Em seu livro, Charles Expilly fornece um final feliz para o enlace entre África e Ocidente. Elabora o romance da “negra de tabuleiro” Manuela, da Costa da Mina, com um francês. Inicialmente vendedora de frutas na rua, após a alforria e a vida em comum com o estrangeiro, “Manuela não carregou
mais o tabuleiro à cabeça. Renunciou às toilettes [vestimentas ] provocantes que deixavam a descoberto as generosas proporções do seu corpo. Seus olhos, sempre orgulhosos, perderam a arrogância. O amor revelara-lhe o
pudor”. Alforria, amor, casamento e distância dos “tabuleiros à
cabeça” seriam indícios de liberdade e de ascensão social. E a  comunhão inter-racial harmoniosa, talvez, um desejo secreto (ou realizado?) do autor.

Sheila de Castro Fariaé professora da UFF e autora de A Colônia em Movimento, Fortuna e Família no Cotidiano Colonial ( Nova Fronteira, 1998).
Saiba mais - Bibliografia EXPILLY, Charles. Mulheres e Costumes do Brasil . 2. ed. SãoPaulo: Editora Nacional; Brasília: INL, 1977.
MOTT, Luiz. Rosa Egipcíaca: uma santa africana no Brasil .
Rio de Janeiro: Bertand do Brasil, 1993.
FIGUEIREDO, Luciano. Barrocas Famílias. Vida Familiar em
Minas Gerais no Século XVIII . São Paulo: Hucitec, 1997.

Fonte :
Revista de História

Quarto grande e senzala

A relação entre senhores e escravos incluía afeto, intimidade
e sexo. Nem por isso eles se moviam de seus lugares, na
rígida hierarquia colonial

Suely Creusa Cordeiro Almeida





 Preparação de farinha de mandioca no início do século XIX, segundo gravura de Rugendas. As relações de proximidade entre livres e escravos não comportava a dissolução das hierarquias. (Biblioteca Nacional da Alemanha)


Sexo e paixão, com ou sem amor, entre livres e escravos. Ainda há quem imagine a atmosfera colonial como um ambiente lasso, sem freios, passível de todos os desvios. Uma sociedade marcada pelo congraçamento do prazer, em que corpos, independentemente de qualquer coisa, se entrelaçavam
numa “democracia” dos contatos que parecia aproximar todos. É uma ideia enganosa. Essa proximidade social nunca existiu.

É certo que as relações entre escravos e senhores incluíam a afetividade e a intimidade, e muitas vezes resultavam em sexo. Mais fortes do que essas
“fraquezas” humanas, porém, eram as hierarquias sociais. Em resposta a tais comportamentos desviantes, prevalecia a busca pela conservação dos padrões da moral cristã e da honra. Quanto maior a ameaça à
norma vigente, pior o castigo.

Se as relações afetivas entre senhores e escravas provocavam escândalos, imagine entre senhoras e escravos. Sinhazinhas se envolviam com crias dos
engenhos, amigos de folguedos, e com eles perdiam a virgindade. Foi o que motivou a queixa de Domingos da Silva Só, que correu à Ouvidoria Geral da Capitania de Pernambuco contra seu escravo Antônio, acusado de estuprar sua filha e fugir com ela, em 1755.

É possível imaginar o cotidiano dessa difícil afeição. A convivência diária aproximou Antônio da filha de seu senhor (de quem não se sabe nome nem idade). O efeito devastador da paixão fez nossos personagens correrem riscos. Encontros furtivos, adiamentos, a angústia entre o certo e o errado, a culpa marcaram a relação espúria e desigual de Antônio com sua senhora. Como a felicidade é quase sempre irresponsável, ele arriscou a vida, e ela, a honra. Por pertencer a um lugar social inferior, ele enfrentou o peso da pobreza, da cor, a dureza da lei. Por ser mulher, ela submeteu-se a ser
abandonada, ter um filho mestiço, sofrer a fúria da família, o
escândalo, o desprezo.

O escravo foi preso no Recife, acumulando ainda as acusações de mandingueiro e detentor de artes diabólicas, as quais teria usado para conquistar a moça, levando-a à gravidez e induzindo-a ao aborto. O ocorrido era grave. As Ordenações Filipinas – código jurídico então vigente em todo o
Império português – eram categóricas nestes casos: ao senhor cabia o direito de se decidir pela pena de morte para o escravo. Mas talvez Antônio fosse um feiticeiro, respeitado por negros e temido por brancos, e uma morte violenta poderia suscitar incômodas revoltas de cativos. Fosse por
isso ou mesmo pelo simples medo de sua magia, Domingos
preferiu denunciá-lo a assassiná-lo. O dilema foi então transferido para a Mesa do Desembargo do Paço: deveria ser aplicada a pena capital? A influenciar a decisão havia outro tipo de hierarquia social: a solidariedade masculina em casos sexuais. Os atos de Antônio podiam ser entendidos com um crime menor. No entanto, mesmo solidários, os juízes não poderiam admitir que denúncias de estupro praticado por negros escravos contra mulheres de “qualidade” se amiudassem. Pediram graça ao Rei, que determinou o encarceramento perpétuo na cadeia da Bahia.

Já o drama de Teresa de Jesus se entrelaçou aos de suas escravas Josefa e Caetana. Teresa foi moça com dote e casou-se em 1735 com Thomaz Vieira da Silva. Dezenove anos depois, dizia ser maltratada com pancadas. Acusava o
marido de havê-la levado de Pernambuco para Lisboa contra a vontade. Josefa e Caetana, por sua vez, haviam ganho alforria à época do matrimônio, mas continuaram servindo ao casal. Acusavam Thomaz de violências físicas, com ameaças de venda para o Maranhão. Recorriam ao Conselho
Ultramarino, afirmando serem livres e desejando continuar ao lado de Teresa.

O tempo, a solidão e a violência aproximaram essas três
mulheres. A intimidade do casal tornou-se também domínio das alforriadas, que passaram a interferir em questões delicadas envolvendo a condição de liberdade que haviam conquistado. Mas eram ameaçadas por Thomaz de serem reescravizadas. E Josefa e Caetana não tinham como sobreviver sozinhas. Não podiam optar pela completa liberdade. O que chama a atenção é o fato de, embora sendo mulheres negras e vivendo em Portugal, terem recorrido às instâncias legais, com a coragem de denunciar um homem
branco e de “qualidade” para afastar o fantasma da reescravização.

Em 1803, outro exemplo de cumplicidade: a fuga espetacular de Dona Ana Senhorinha teve repercussão nas vilas de Igarassu e Recife, e seria impossível sem a ajuda dos escravos. Ela era casada, filha de um viúvo que se dizia fidalgo, cavaleiro da Casa Real, capitão da primeira Companhia do Regimento Miliciano da Vila de Igarassu,chamado José Félix Bandeira Cezar de Mello. Com a morte da mãe, Ana Senhorinha foi educada no Recolhimento da Vila de Igarassu com todos os cuidados dedicados a uma moça de
“qualidade”, retirada dali só para o casamento. Este foi celebrado com Antonio da Silva Pereira, um parente seu. O consórcio andou mal, Antonio era um homem inquieto, sempre buscando amores e ausentando-se da casa. Tal situação levou Ana Senhorinha a optar por voltar ao Recolhimento,
acompanhada por sua filha.

Tranquilo com a proteção que o Recolhimento garantia à honra de sua filha e de sua neta, José Félix partiu para a Bahia para tratar de seus negócios. No retorno, o viúvo encontrou uma situação que qualificou de desgraçada. O
corregedor da Comarca de Pernambuco, João de Freitas de Albuquerque, atuava na Vila de Igarassu quando se envolveu afetivamente com Ana Senhorinha. É provável que tenham se conhecido na Igreja de São Cosme e Damião, quase colada ao Recolhimento. As mulheres recolhidas na casa não guardavam clausura completa, ainda mais Ana, que aguardava que o
marido mudasse de atitude e voltasse a desejá-la como esposa. A solidão e as carências a levaram a aceitar que João a cortejasse. Não sabemos se para João foi uma aventura ou uma grande paixão, mas o fato é que não poupou
esforços para tê-la consigo.

Vem de relato do próprio pai a versão de que o corregedor “enfrentou todas as forças e poderes”, lutando durante um ano para convencer sua filha, mas sem sucesso. Talvez ainsistência de João fosse uma forma que o viúvo encontrou para reduzir a culpa de Ana Senhorinha. Afinal, ela era casada, e as Ordenações Filipinas eram severas quanto ao adultério. Provavelmente era uma família de “menor qualidade” porque, se tivesse melhores condições, a morte do corregedor poderia ser uma saída para lavar a honra da família.

Vencidas as resistências de Ana, deu-se então a fuga. A operação foi organizada por um grupo que incluía dois pardos (um deles possivelmente uma escrava) e um padre. O percurso entre a vila de Igarassu e a do Recife aconteceu à noite, chegando Ana Senhorinha ao Porto das Canoas ao
amanhecer. Foi abrigada na casa de um padeiro que morava na Rua da Senzala, gente de cor, ligada à escravidão. Sabendo o corregedor da chegada de sua amada, achou sábio esperar até a noite, quando enfim a conduziu em cadeirinha para sua casa. Ana Senhorinha, estabelecida com sua escrava Rita, trazida do Recolhimento e que fora sua cúmplice na fuga,
concordou que João mandasse sequestrar mais duas escravas de seu pai com as quais tinha amizade. Esta atitude acirrou os ânimos, levando o pai de Ana a pleitear, diante do Rei, a apreensão das escravas e a prisão da filha, com posterior clausura forçada no Recolhimento de Nossa Senhora de
Conceição, em Olinda. Uma diligência em estilo policial cumpriu a ordem aprovada pelo Rei e a infeliz Ana Senhorinha viu-se enclausurada pela terceira vez – agora como castigo, por ser mulher e ter ousado fazer uma escolha.

Aconselhando, auxiliando em fugas ou envolvendo-se a ponto de gerarem filhos, os escravos participavam das questões mais íntimas e delicadas que permeavam a vida dos seus senhores. A sociedade escravista possibilitava múltiplas relações e negociações, desde que permanecesse clara, como
sempre permaneceu, a diferença entre “dominadores” e “dominados”.

Suely Creusa Cordeiro de Almeida é professora da
Universidade Federal Rural de Pernambuco e autora de O sexo
devoto: normatização e resistência feminina no Império
Português XVI-XVIII (UFPE, 2005) .

Saiba mais - Bibliografia
CARVALHO, Marcus Joaquim Maciel de . Liberdade: rotinas e
rupturas do escravismo Recife, 1822-1850 . Recife: Editora
Universitária/UFPE, 2002.
FREYRE, Gilberto. Casa-Grande & Senzala: formação da
família brasileira sob o regime de economia patriarcal . 35ª ed.
Rio de Janeiro: Record, 1999.
SILVA, Gian Carlo de Melo. Um só corpo, uma só carne:
casamento, cotidiano e mestiçagem no Recife colonial
(1790-1800) . Recife: Editora Universitária/UFPE, 2010.

Fonte:
http://www.revistadehistoria.com.br/secao/capa/quarto-grande-e-senzala

Ah, essas ideias francesas!

Em tempos de revoluções, Recife tornou-se mais feminina e
foi palco de crescente liberação sexual no século XIX


Marcus J. M. de Carvalho



 Atraídas pela vida urbana, as mulheres do século XIX passariam a olhar a rua cada vez mais como “o lugar da liberdade e do progresso”. (Fundação Biblioteca Nacional)

 

A primeira metade do século XIX, no Nordeste, é a época da
Insurreição Pernambucana (1817), da Confederação do
Equador (1824) e da Insurreição Praieira (1848). Nas ruas
ouviam-se as palavras de ordem do Iluminismo, as chamadas
“ideias francesas”, tais como República e Constituição.
Louvava-se a liberdade que, tal como hoje em dia, tinha
múltiplos significados.

Mas, e as mulheres? E as alcovas? Será que aquelas ideias
ficaram apenas no terreno da política?
Embora não tenha havido nenhuma revolução sexual paralela
às chamadas “revoluções liberais”, muita coisa também
mudaria nos costumes íntimos das cidades brasileiras. A
população livre dos bairros centrais do Recife praticamente
dobrou entre a Independência e 1850, principalmente devido à
vinda de gente do interior imediato, área de engenhos
decadentes, paulatinamente engolidos pela cidade. Muitos
desses novos habitantes eram mulheres livres e libertas. Nos
censos de 1828 e 1855, elas eram a maioria absoluta nos
bairros centrais do Recife. A dinâmica da vida urbana atraía a
população feminina, pois a cidade era percebida como o lugar
da liberdade e do progresso. Lá havia mais oportunidades de
trabalho e de vivências mais significativas do que na Zona da
Mata submetida às duras regras não escritas do patriarcado
rural.

Sintoma de uma possível maior licenciosidade é o número de
nascimentos fora dos laços matrimoniais registrados nas
igrejas do Recife. Nos bairros centrais da cidade (Recife,
Santo Antônio, São José e Boa Vista), 46% das crianças
batizadas em 1838 eram filhos ilegítimos. Já nas freguesias
açucareiras de Jaboatão, Ipojuca, Cabo e Goiana, eram
apenas 25%. Para manter esses filhos, era inevitável procurar
emprego. Muitas casas eram verdadeiras indústrias,
oferecendo nos jornais serviços variados que o mercado de
trabalho reservava às mulheres, tais como ensinar as
primeiras letras, fabricar doces e costurar roupas. As damas
do Recife vestiam-se à francesa. As mais ricas com vestidos
confeccionados em Paris, enquanto as demais copiavam os
padrões das revistas francesas de moda. Nos anos 1840,
havia francesas oferecendo-se nos jornais para ensinar a
língua, tocar piano, dançar e costurar de acordo com o
figurino de sua terra. Mas havia também brasileiras que
sabiam costurar e buscavam emprego em loja “francesa”.
Enquanto isso, a rua ainda era um desafio. O espaço público
foi uma construção essencialmente masculina, do que resultou
uma confusão semântica que perdura até os dias de hoje.

“Mulher pública” era sinônimo de prostituta na Europa e no
Brasil. A prostituição espalhava-se pelas ruas e pontes. No
entorno do forte das Cinco Pontas, as “vivandeiras” causavam
desordens. Em São José, “meretrizes escandalosas”
incomodavam a Câmara. Um dos pontos do trottoir era na rua
do Imperador, no coração do então aristocrático bairro de
Santo Antônio. Em 1838, foram presas na província 169
pessoas “sem ofício”, “quase na totalidade meretrizes”,
segundo Jeronymo Martiniano Figueira de Mello, que foi
senador no Império, e escreveu um ensaio estatístico sobre
Pernambuco publicado em 1852.Na metade do século, o
organizador das estatísticas provinciais escreveu: “Como em
todo o império [...], as pretas em geral e uma grande parte
das outras classes inferiores da sociedade, pertencentes ao
sexo feminino, se entregam mais ou menos à prostituição”.

Antes que os prostíbulos brasileiros fossem invadidos por
polacas e francesas na virada do século XIX para o XX,
algumas açorianas chegaram ao Recife em navios abarrotados
de gente. Só podiam desembarcar se alguém pagasse o preço
da viagem. Centenas de pessoas atravessaram o Atlântico
nessas circunstâncias nas décadas de 1840 e 1850. Essa
prática abusiva era chamada pelo cônsul lusitano de “tráfico
de escravatura branca”. Havia verdadeiros leilões dentro das
embarcações. As mais bonitas alcançavam os melhores
preços ainda no convés. Depois eram levadas para as casas
noturnas. Na maioria das vezes, não era delas a escolha, mas
de quem arrematava seus serviços pelo valor da passagem.
Pouco a pouco, os antigos hábitos de reclusão feminina
começaram a ser desafiados nos eventos do bumba meu boi e
nos lunduns. Lamentava o padre Carapuceiro (pseudônimo de
Lopes Gama, importante cronista da época e diretor do Liceu
Pernambucano e da Faculdade de Direito) que, àquela altura,
namorar já não era mais apenas ser “janeleira”. A participação
de mulheres livres nesses folguedos é um indício do
afrouxamento dos costumes patriarcais de reclusão feminina.
Mulheres reagiam aos códigos de conduta que lhes eram
impostos. Inclusive as da elite. Foi o que notou o engenheiro
francês Vauthier, ao frequentar “saraus” nas casas das
famílias aristocráticas, onde era servido chá à inglesa.
Segundo ele, várias mulheres, tanto solteiras como casadas,
tentaram seduzi-lo. E o flerte não estava apenas nas salas.
Foi nos banhos de rio que viram dona Bernarda Francisca das
Chagas de braços dados com o sargento João Rodrigues da
Silva, levando seu marido a pedir o divórcio. Dona Bernarda
defendeu-se. Negou as acusações, apesar das muitas
testemunhas nos autos que a viram pela cidade com um
“pardo trigueiro”, entrando até junto com ele no “banheiro” em
uma ilha do rio Capibaribe, do bairro Capunga. Alegou
também que seu marido a deixara para se amancebar com
uma “preta” nos arredores da cidade.

Não era raro um homem casado ter outras mulheres. Mesmo
os estrangeiros assimilavam essas práticas. Vauthier tinha um
conterrâneo no Recife que trouxera uma mulher do interior
somente para seu deleite. Outro francês, Tollenare, notou que
os homens das elites chegavam a ter ciúmes das suas
“mulatas de estimação”. Esses hábitos explicam os anúncios
de escravas para “serviço de homem solteiro”, um modelo
intermediário entre a empregada doméstica e a prostituição
da cativa. Dentro de casa, as empregadas, quer fossem
cativas ou livres, eram quase sempre assediadas pelos
marmanjos da família. As sinhás eram compelidas a aturar
esses deslizes, mas não é razoável supor que aceitassem
sempre, conformadas. Muitas cativas sofriam a dupla
opressão do assédio do senhor e do ciúme da sinhá. O
nascimento de crianças mestiças era a prova material da
infidelidade. Dizia O Popular , em 7 de julho de 1830, sobre a
bastardia: “Podemos desafiar a família mais presunçosa do
Brasil, que se mostre em todos os seus ramos desligada da
gente parda, e que não tenha parentes nesta classe ao menos
por linhas travessas[sic]”. Pode-se dizer que a paz da família
nuclear patriarcal tinha um alicerce na prostituição. Ao
recorrer à prostituta, o homem casado evitava que suas
frustrações transbordassem para o recinto onde dormiam as
amas. Para O Popular , era preciso que as luzes do século
também chegassem ao leito conjugal, protegendo assim a
família. Para isso, as esposas deveriam continuar sendo
“amantes” dos seus maridos.

As perigosas “ideias francesas”, que questionavam a
monarquia e até a escravidão, trouxeram ainda outros
“francesismos”, como se dizia na época. Crítico conservador
dos costumes, o Carapuceiro comentou espantado que nos
bailes estavam sendo adotados hábitos “franceses”, como
“dar beijocas nas senhoras”. E, em resposta a outro jornal –
segundo ele escrito por uma dama – condenava o incentivo
para que as damas flertassem como forma de conseguir
melhores casamentos. Para o padre Carapuceiro, a autora do
jornal era uma “gamenha”, o que chamaríamos hoje de mulher
assanhada.

No ano da Insurreição Praieira, 1848, o anúncio de um baile
oferecido à fina flor da sociedade pernambucana deixava
entrever como essas ideias estavam sendo postas em prática.
A festa pretendia seguir o que se fazia na francófila corte no
Rio de Janeiro. Começando ainda cedo, a dança terminaria às
três da manhã. Cada detalhe das regras da festa era
acompanhado da explicação: era assim que se fazia na corte.
Inclusive na parte que dizia ser terminantemente proibido
tentar tirar a máscara dos presentes, preservando-se a
identidade dos mascarados. Pode-se dizer que, numa cidade
onde era normal uma festa de mascarados acabar às três da
madrugada, namorar, realmente, já não era mais ser apenas
“janeleira”.

Marcus J. M. de Carvalhoé professor da UFPE e autor, com
João José Reis e Flávio dos Santos Gomes, de O Alufá
Rufino: Tráfico, Escravidão e Liberdade no Atlântico Negro
(c.1822 – c. 1853) (Companhia das Letras, 2010).
Saiba mais - Bibliografia
CARVALHO, Marcus J.M. Liberdade, Rotinas e Rupturas do
Escravismo. Recife: UFPE, 1998.
DEL PRIORE, Mary. História das mulheres no Brasil . São Paulo:
UNESP/ Contexto, 1997.
PALLARES-BURKE, Maria Lúcia. O Carapuceiro e outros
Ensaios de Tradução Cultura. São Paulo: Hucitec, 1996.
Fonte:Revista de História

Posições políticas


A exuberante fama de país sensual esconde em seus
bastidores desigualdades de raça, classe e gênero

María Elvira Díaz-Benítez

 Acima, capa da revista A maça, de 1929. Em sua obra, Gilberto Freyre via a miscigenação
 no Brasil como algo positivo e “bem dosado”, contrariando as teses científicas da época. (Fundação Biblioteca Nacional)

Uma das principais imagens que surgem quando se pensa no
Brasil é uma suposta sexualidade desenfreada. Aqui, o sexo e
as sexualidades teriam características próprias, excepcionais,
territórios de proezas e exotismo.

Este é um lado da moeda. Mas existe outro. A grande imagem
de liberação sexual oblitera uma realidade sensível: as
desigualdades na participação democrática efetiva. Hoje, o
país presencia um embate sociopolítico em que as bancadas
mais conservadoras, afiliadas a grupos religiosos, ganham
espaço considerável no Congresso, elevando seus gritos de
protesto contra direitos sexuais já conquistados e ameaçando
a laicidade do Estado. Se, por um lado, para o mundo, o Brasil
é um lugar de eterno verão, produtor de um carnaval lascivo,
de corpos e prazeres tropicais e com grande oferta de turismo
sexual, por outro, assistimos à eleição de um pastor para a
presidência da Comissão de Direitos Humanos e Minorias da
Câmara, apesar de suas posições polêmicas sobre
homossexuais, negros e os direitos das mulheres.

Se todo sexo é político, como afirmou a antropóloga norte-
americana Gayle Rubin, a sexualidade brasileira também não é
neutra. Ela está envolvida em relações de poder. Evoca
aqueles discursos do começo do século XX sobre raça,
mestiçagem e o futuro da nação, os métodos eugênicos, a
criação das patologias e dos pervertidos sexuais. Em poucas
palavras, sexualidade e raça se encontram intimamente
ligadas nos imaginários coletivos de brasilidade – que foram
construídos pela história, a medicina, a literatura, a
criminologia, a religião, a mídia, a pornografia – envolvendo
questões de classe e de gênero.

O Brasil é uma chave para se pensar na sexualização da raça
e na racialização do sexo. Foi o primeiro país na América
Latina a ter um movimento eugênico organizado. O termo
eugenia foi criado por Francis Galton, antropólogo,
matemático, geógrafo e médico inglês. Seria o estudo dos
agentes que podem melhorar ou degenerar as qualidades
raciais de uma população em gerações futuras. Inspirado na
obra maior de seu primo, o biólogo evolucionista Charles
Darwin, A origem das espécies (1859), Galton acreditava que
a espécie humana poderia ser melhorada evitando-se
cruzamentos indesejáveis, isto é, através de uma seleção
artificial. Para os cientistas e seguidores do movimento
eugenista europeu, o Brasil era considerado um país disgênico
(degenerado geneticamente) por excelência e seu futuro
estava ameaçado devido ao clima tropical e à população
altamente miscigenada.

Os eugenistas brasileiros preocupavam-se em aprimorar um
país cuja população era pobre e racialmente muito
heterogênea. O tema mobilizava as elites intelectuais. Nina
Rodrigues, desde finais do século XIX, já se mostrava cético
ante a possibilidade de alcançar uma unidade nacional via
mestiçagem. Apesar de seus méritos como médico e primeiro
pesquisador da influência africana no Brasil, para ele a
inferioridade do africano estava estabelecida fora de qualquer
dúvida científica. Menos pessimista, o antropólogo João
Batista de Lacerda, em 1911, vaticinou que em um período de
três gerações (100 anos) o país conseguiria produzir uma
população de fenótipo branco se continuasse a importar
europeus, miscigenando-os com os nativos de um modo “bem
dosado”. Para o historiador Oliveira Vianna, o “tipo
antropológico e racial brasileiro” era o resultado de uma
desordem étnica causada principalmente pelos “typos”
africanos. Na obra Casa Grande & Senzala (1933), Gilberto
Freyre contesta o argumento que Oliveira Vianna construiu em
Evolução do Povo Brasileiro (1923) . Para o sociólogo
pernambucano, a história social brasileira era o produto da
heterogeneidade e dos encontros inter-raciais que
“harmonicamente” ocorreram entre membros das diferentes
raças.

Como os seus críticos apontam, em sua apologia à
mestiçagem, Freyre, criou uma imagem da história escravista
na qual brancos e negros, escravos e amos e seus filhos
mulatos viviam em uma relação de fraternidade e intimidade.
O segredo para essa convivência fraternal seria a interação
sexual, que minguou o despotismo e a opressão
característicos do contexto escravista. Esse mito da
“escravidão cordial ou branda”, como é chamado pelos
críticos de Freyre, faz-se mais evidente com a figura do
mulato como elemento mediador. Sua pele mais clara lhe
permitiria entrar em um processo de mobilidade social,
transitando entre as raças e conciliando os extremos. A teoria
de Gilberto Freyre é criticada por não considerar que, num
contexto escravista, existe um exercício do poder que recai
sobre a sexualidade, em uma sociedade de relações de gênero
e de classe assimétricas.

Os programas eugenistas advogavam o controle da
sexualidade. Em defesa de uma sociedade sadia, em princípios
do século XX, empregaram-se políticas de controle dos
hábitos: repressão do ócio e da vadiagem, do comportamento
sexual de mulheres (reprodução, higiene, cuidado com
crianças) e dos homens mediante a religião, a medicina e a
política. O cuidado com a sexualidade masculina estava
diretamente relacionado com o aperfeiçoamento da população:
relacionar-se com prostitutas, adquirir doenças venéreas ou
ter sexo homoerótico eram vistos como causas de
degeneração. Ganharam importância visões e práticas
relacionadas ao nacionalismo, a modelos moralistas de
família, heterossexualidade, masculinidade, feminilidade e
também normalidade sexual. A função reprodutora do sexo era
a pedra institucional de uma ordem nacional excludente e
repressora.
Paralelamente a essas políticas de depuração racial e sexual,
os intelectuais criavam ideais de nação com base no encontro
sexual inter-racial. Se os mulatos eram figuras emblemáticas,
o que dizer especificamente das mulatas?
A figura da mulata encarna o corpo e a alma do desejo. E foi
assim que se converteu em símbolo nacional, construído pela
literatura, a medicina, o carnaval e, mais recentemente, pelas
agências de turismo e os canais televisivos. A categoria da
mulata, como disse a antropóloga Mariza Corrêa, “pode
contribuir para questionarmos nossa forma habitual de tratar
seja das relações de raça, seja das relações de gênero”, mas
também as relações de classe, pois essa mulata faz apologia
ao mundo dos pobres – os quais, segundo o imaginário social,
vivem mais próximos da natureza e dos instintos. A mulata é,
desde o começo do século XX e até hoje, o fio condutor de um
ideário nacional que racializa os desejos sexuais. Mais
recentemente, o mercado do sexo (pornografia, prostituição e
turismo) inventou outra figura racial e de gênero que encarna
em seu corpo símbolos de classe e de nação: a travesti .
Em diversas legendas de filmes pornográficos, a pobreza, a
nacionalidade e o gênero das travestis são vendidos como
algo prodigioso, exótico e simultaneamente esdrúxulo. O
contrário também acontece: o glamour de algumas travestis
ou de transexuais destacadas – como a pioneira Roberta
Close – é ofertado como sinônimo da abertura sexual dos
brasileiros e de uma sociedade moderna e bonita, porém,
branca.

No Ocidente, historicamente tem se privilegiado o branco e o
heterossexual como paradigmas legítimos e modelos morais
que colocam o outro como subalterno. Daí que exista um
vínculo entre heterossexismo e racismo. Ambos são
dispositivos de opressão que existem em uma relação e que
permitem, por exemplo, pensar que um homem negro é
obrigatoriamente macho e que nos circuitos homossexuais a
branquidade é o padrão de beleza hegemônico. O dispositivo
permite também que movimentos de esquerda, como o negro
e o proletário, mesmo sendo revolucionários, conservem em
seus valores concepções homofóbicas, machistas e misóginas,
e que as políticas LGBT nem sempre deem atenção aos
fatores classe e raça, colocando pessoas socialmente diversas
em um mesmo patamar.

Estas são as contradições de um país onde a sexualidade,
vista de fora como libertária, na verdade se entrecruza com
diversas formas de desigualdade.

María Elvira Díaz-Benítez é professora adjunta no Programa
de Pós-graduação em Antropologia Social do Museu Nacional-
UFRJ e autora do livro Nas redes do sexo: os bastidores do
pornô brasileiro (Zahar, 2010).

Saiba mais - Bibliografia

CORRÊA, Mariza. “Sobre a invenção da mulata”. Cadernos
PAGU, n. 6-7, p.35-50, 1996.
FREYRE, Gilberto. Casa grande e senzala. Formação da
família brasileira sob o regime da economia patriarcal . Rio de
Janeiro: José Olympio, 1973.
STEPAN, Nancy. “Eugenia no Brasil 1917-1940”. In:
HOCHMAN, Gilberto; ARMUS, Diego (orgs.). Saúde e Doença
na América Latina e Caribe . Rio de Janeiro: Editora Fiocruz,
2004.
Fonte:

domingo, 7 de julho de 2013

As sacanagens clericais

Ronaldo Vainfas

Quando o padre Manuel da Nóbrega chegou à Bahia, em 1549, fez questão de manifestar sua insatisfação com a conduta do clero colonial. Os padres viviam atracados com índias, alegando que eram suas escravas

  
Velho entrega a uma jovem uma carta de amor no desenho de Carlos Julião (1740- 1811). Amor cortês para as brancas, mãos nos peitos para as negras: as investidas variavam de acordo com os “tipos” de mulheres. (Fundação Biblioteca Nacional)

O padre Manuel da Nóbrega chegou à Bahia em 1549, à frente de seis inacianos, inaugurando a presença jesuítica na colônia. Em 1553, não teve como esconder seu desalento com a conduta do clero colonial. “A evitar pecados esse clero não veio”, escreveu a outro padre. Queixou-se de que os padres viviam amancebados com as índias, chamadas por ele de “negras da terra”, alegando que eram suas escravas! Além disso, absolviam todo tipo de lubricidade, sem dar qualquer penitência. Era caso de “chorar”, escreveu Nóbrega.

É claro que ele se referia ao clero secular, não aos quadros da Companhia, “soldados de Cristo”, que levavam a sério a militância apostólica. Quando não a levavam, eram expulsos. Já os “clérigos do hábito de São Pedro” não tinham a mesma formação dos jesuítas ou de outros frades regulares. O paradigma deste julgamento era, em todo caso, a moral cristã, em sua versão católica: sexo é coisa má, só tolerável no matrimônio, e só de vez em quando, para procriar os filhos de Deus. Nóbrega teria razão ao criticar, em meados do século XVI, os padres que vinham pastorear almas no Brasil? Do ponto de vista da Igreja, tinha toda a razão – e ainda teria se vivesse no século XVII ou no XVIII.

Basta ler a confissão do padre Frutuoso Álvares, o primeiro a se apresentar ao visitador do Santo Ofício, na Bahia, em 29 de julho de 1591.  Disse que nos últimos 15 anos tinha cometido “tocamentos torpes” com 40 pessoas, “abraçando, beijando”, a começar por um jovem de 18 anos. Contou que, neste caso, “tocou com as mãos” em sua “natura”, isto é, no seu pênis, provocando, por duas vezes, “polução” (gozo) no “membro viril” do rapaz.
A linguagem oficial da época é, aliás, saborosa. O pênis era chamado de “natura”, “membro viril”, “membro desonesto”. Desonestidade, por exemplo, era palavra muito usada para designar lubricidade, sensualidade ou, simplesmente, sacanagem. Nos documentos de época já aparece a expressão “fazer as sacanas”. No caso dos tocamentos em que padre Frutuoso era perito, também havia uma expressão em parte familiar: “jogar as punhetas”.

Padre Frutuoso, vigário no Recôncavo da Bahia de Todos os Santos – todos eles! – foi o primeiro a confessar que “fazia sacanas” no Brasil desde o tempo em que serviu na Madeira – a ilha, vale dizer. Estimou em cerca de 100 parceiros, “pouco mais ou menos”, o número de rapazes (sempre jovens) nos quais jogara “as punhetas”. Devem ter sido uns 200 ou 300.

Nóbrega tinha razão ao criticar os padres seculares? Há vários outros exemplos nos papéis inquisitoriais. Padre Jácome de Queiroz também se apresentou, de sua própria iniciativa, ao visitador, para confessar que tinha sodomizado duas índias. Alegou que o fez sem querer: como tinha tomado muito vinho, ao achegar-se às meninas, “errou de vaso” e, ao invés de penetrar no “vaso natural”, como devia (?), meteu seu “membro desonesto” no vaso traseiro, por vezes grafado no documento, em latim, vas preposterum.

O mais incrível neste caso é que o visitador mal ligou para o fato de que as índias em causa eram duas meninas, uma de 6, outra de 7 anos. Hoje seria caso de pedofilia e abuso sexual de menores. Na época, não passava de sodomia. A questão era saber em que vaso o padre meteu seu “membro viril” e se o fez por escolha ou por acidente. O grande historiador francês Phillipe Ariès esclarece: nesta época, as pessoas viam as crianças como “pequenos adultos”.

Devemos deduzir, desses exemplos, que a lascívia dos padres era típica do clero secular? Nada disso. No século XVIII, o frei franciscano Luís de Nazaré, vigário nas Minas, alegava ser exorcista sem sê-lo e, quando sabia de moças adoecidas e melancólicas, apresentava-se para curá-las, expulsando o demônio. De Bíblia na mão e com seu membro viril à mostra, jogava o “jogo dos punhos”, esfregando o sêmen pelo corpo da “possuída”. Preso pelo Santo Ofício, alegou que fez tudo por luxúria, não por acreditar que o sêmen era capaz de expulsar demônios. Acrescentou que as mulheres do Brasil eram tolas e acreditavam em qualquer coisa. A Inquisição só não disse “tudo bem” porque cassou as ordens sacras do frei.

Também no século XVIII, outro frade regular, pertencente à Ordem das Mercês do Pará, preferia rapazes. Gostava, em particular, de oferecer seu “vaso traseiro” e como por vezes o “vaso sangrava”, ele dizia que estava menstruado. Numa palavra: o frade das Mercês dizia que era mulher, disfarçada de frade. Ele acrescentou, como frei Luís de Nazaré, de Minas, que também os rapazes do Brasil eram tolos, acreditavam em tudo.
Voltando aos padres seculares e aos heterossexuais, Lana Lage, em sua tese de doutorado, tratou dos solicitantes ad turpia. Quem eram? Padres, em geral seculares, que no ato da confissão, ou a propósito dela, “cantavam” as mulheres, quando não avançavam nelas. Muitos alegavam que, sendo eles padres, não havia pecado no avanço, Deus perdoava. Outros, tratando com mulheres casadas, diziam que eles, padres, eram ricos, e poderiam regalá-las muito mais que seus maridos. A subversão da doutrina católica era total.

O mais interessante, porém, é que havia uma gradação “sociológica”nas investidas dos solicitantes ad turpia: com mulheres “brancas e honradas”, eles vinham com uma conversa amorosa, tipo amor cortês. Um deles mandou uma florzinha entredentes pelas grades do confessionário. Mas com mulheres negras, escravas ou forras, cortesia zero: mãos nos peitos, mãos debaixo da saia.

Trópico dos pecados? Sim. Prova de que a Igreja era conivente com sodomias, pedofilias e abusos sexuais? Não. Só conhecemos tudo isso porque a Igreja Católica tinha aparelhos de vigilância e punição dos padres que subvertiam a moral cristã. Puniam alguns. Os papéis da Inquisição dão a prova. Os jesuítas, por sua vez, quase não aparecem como réus nesses escândalos. Ad majorem Dei Gloriam – tudo pela glória de Deus. Ou, como diria Gilberto Freyre: “donzelões intransigentes”.
Ronaldo Vainfas é professor da Universidade Federal Fluminense e autor de Trópico dos pecados: moral, sexualidade e Inquisição no Brasil (3. ed., Civilização Brasileira, 2010).

Saiba Mais - Bibliografia

LIMA, Lana Lage da Gama. A confissão pelo avesso: o crime de solicitação no Brasil colonial. Tese (Doutorado em História) – Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Sociais, Universidade de São Paulo, 1990.
ARIÈS, Philippe. História social da infância e da família. Rio de Janeiro: LCT, 1978.
SANTO OFÍCIO DA INQUISIÇÃO DE LISBOA. Confissões da Bahia. São Paulo: Companhia das Letras, 1997.

 FonteRevista de História

quarta-feira, 3 de julho de 2013

A escravidão Indígena: Solução caseira

Elisa Frühauf Garcia


 Base para a formação da economia colonial, a captura e a escravização indígena na litogravura de Jean Bastiste Debret do século XIX. (Fundação Biblioteca Nacional)

Tão logo fizeram os primeiros contatos na costa brasileira, os portugueses começaram a carregar suas embarcações com mercadorias extraídas da nova terra para serem levadas à Europa. Entre elas, o pau-brasil, animais exóticos e... índios. Em pouco tempo tornou-se comum encontrar escravos indígenas nas ruas de Lisboa e arredores, principalmente nos serviços domésticos. Eles também eram vendidos na Espanha e em seus domínios.
Quando os portugueses deram início às atividades produtivas no Brasil, a partir da criação das capitanias hereditárias, decidiram utilizar os índios para o trabalho escravo. Sem recursos para importar africanos e sem as condições necessárias para o emprego de mão de obra assalariada, os indígenas acabaram sendo a base da formação da economia colonial.

Transformá-los em escravos era uma tarefa difícil e arriscada. A presença portuguesa no Brasil e a ocupação das novas terras dependiam do apoio da população nativa. Para defender tão vasto território, a Coroa precisava dos índios como aliados militares contra os concorrentes europeus (no século XVI, especialmente os franceses). Eles também eram úteis para combater grupos indígenas rivais que atacavam os incipientes núcleos coloniais, além de fornecerem informações e alimentos indispensáveis à sobrevivência em uma terra ainda mal conhecida.

Se a princípio chegou a existir um frágil equilíbrio entre índios e portugueses, ele logo se rompeu. Os nativos acharam bom negócio vender aos recém-chegados seus prisioneiros de guerra, antes utilizados em atividades rituais e sociais (como a antropofagia). Quando, porém, o apresamento de escravos tornou-se um negócio concorrido, a ânsia de obter mais cativos desfez as alianças iniciais.

No início da década de 1540, por exemplo, um certo Henrique Luís, traficante de escravos indígenas na costa, botou a perder o contato amistoso construído até então com os índios da atual divisa do Rio de Janeiro com o Espírito Santo. Tomado pela ambição de um lucro rápido e fácil, ele sequestrou uma liderança nativa aliada e exigiu como resgate um determinado número de escravos. O resgate foi pago, mas o comerciante, ao invés de cumprir o acordo, entregou o chefe ao grupo rival, obtendo assim escravos de ambos os lados. Os índios reagiram à altura da ofensa: tornaram a vida dos portugueses impossível naquela região. Não foi à toa que, ao escrever a sua História do Brasil no início do século XVII, frei Vicente do Salvador comentou que não era possível obter um testemunho direto sobre a ferocidade daqueles índios, pois os que por lá se aventuravam não retornavam com vida para contar.

Muitos colonos apelaram a Deus e escreveram ao rei, implorando por alguma atitude em relação à conduta inescrupulosa dos traficantes. Não agiam movidos por fins humanitários, mas sim a partir de cálculos estratégicos: se as coisas continuassem como estavam, temiam que os portugueses fossem expulsos do Brasil. Para piorar, os franceses se aproximavam cada vez mais dos índios e entravam na disputa pelo território. A Coroa se viu então diante de um dilema: como escravizá-los e, ao mesmo tempo, manter a sua “amizade”? A solução encontrada foi separar os índios aliados dos índios inimigos.

Esta diferenciação já existia nas primeiras instruções dos monarcas, que aconselhavam os navegadores a tratarem com distinção os líderes “amigos” e evitarem conflitos. Mas a nova postura em relação aos índios só começou a ser sistematizada em 1549, com a instalação do governo-geral em Salvador. Coube ao primeiro governador, Tomé de Souza, regulamentar a relação com os índios. Para isso, contava com dois importantes recursos: um regimento elaborado pelo rei oferecendo garantias aos aliados e a presença dos jesuítas, que chegaram na mesma época e passaram a ter voz ativa nas questões indígenas.

O estatuto dos índios na sociedade colonial reafirmava a liberdade dos aliados. É bem verdade que eles eram obrigados a trabalhar para a Coroa e para os colonos, mas deveriam ser remunerados e tinham uma série de outras garantias, como a propriedade coletiva das terras dos seus aldeamentos. A escravização dos índios, porém, continuava permitida em duas situações: o resgate e a guerra justa. O primeiro fazia referência aos prisioneiros feitos pelos próprios índios, destinados à antropofagia. Neste caso, algum colono poderia resgatar o prisioneiro que, em retribuição, trabalharia algum tempo como escravo. Já a guerra justa era um recurso empregado quando os índios atacavam os portugueses, que então tinham o direito de defender-se e de escravizar os prisioneiros. Não foram poucos, no entanto, as guerras justas e os resgates que não passaram de um pretexto para a obtenção de escravos.

À medida que a economia colonial se desenvolvia a partir de um produto destinado ao mercado internacional (o açúcar no Nordeste), os colonos começaram a importar escravos de origem africana. Assim, evitavam problemas com a lei e se beneficiavam da maior regularidade da oferta desta mão de obra. Trabalhadores indígenas, escravos ou livres, continuaram a existir, mas não formavam mais a base da produção.

No entanto, em regiões menos prósperas, os índios ainda eram parte importante da mão de obra, por vezes a principal. Sem outra alternativa de enriquecimento, os colonos lutavam pela manutenção dos "seus índios", como então se dizia. Os paulistas alegavam que os índios eram “um remédio para a sua pobreza”. Uma forma de mantê-los cativos era a administração particular. Teoricamente, tratava-se de uma relação de troca: os índios eram livres, mas prestavam serviços ao seu "administrador" que, como pagamento, os instruía na fé católica. Na prática, muitas vezes adquiria ares de escravidão, como quando os índios eram deixados em testamento junto com as demais propriedades.

Em certas ocasiões, como ocorreu em 1640, as tentativas de proibir definitivamente a escravidão indígena geraram verdadeiras revoltas, obrigando a Coroa a negociar. Na época, os jesuítas estavam empenhados em obter a proibição das expedições dos paulistas às missões do Paraguai em busca de cativos, conhecidas como "bandeiras" e completamente ilegais. Não foi difícil obter do papa e do rei a proibição específica de tal atividade, o problema foi colocá-la em prática. Por conta disso, os jesuítas foram sumariamente expulsos de São Paulo. No Rio de Janeiro, por pouco não aconteceu o mesmo: quando os moradores ficaram sabendo da notícia, dirigiram-se enfurecidos à residência dos padres. Alguns, mais exaltados, gritavam: "Mata, mata!". Diante da ameaça, os jesuítas recuaram e deixaram as coisas como estavam. Dessa vez, como em muitas outras, os colonos ganharam.

O cenário só se modificou no final da década de 1750, quando o secretário de Estado do Reino de Portugal, futuro Marquês de Pombal, declarou a absoluta e definitiva liberdade indígena. O Diretório dos Índios propunha a inserção dos índios na sociedade colonial em condições de igualdade com os súditos de origem portuguesa. A Coroa pretendia assim criar uma massa populacional capaz de ocupar o território brasileiro, especialmente as áreas de fronteira em disputa com a Espanha. Por um lado, os índios tiveram dificuldades em lidar com a nova realidade, que previa uma série de mudanças culturais, como a obrigatoriedade do uso da língua portuguesa. Por outro, receberam bem certas medidas, como o acesso a cargos geralmente restritos aos luso-brasileiros, como oficiais camarários e militares.

De maneira geral, os índios fizeram um uso bastante ativo do Diretório em diferentes partes do Brasil. Muitos já possuíam uma longa experiência com a sociedade colonial e sabiam utilizar os recursos disponíveis a seu favor. Índios que estavam em situação de cativeiro irregular, por exemplo, conseguiram obter a liberdade recorrendo à Justiça. Sua lenta e progressiva conquista de direitos começava, de fato, ali.

Elisa Frühauf Garcia é professora da Universidade Federal Fluminense e autora de As diversas formas de ser índio (Arquivo Nacional, 2009).

Saiba mais - Bibliografia

MARCHANT, Alexander. Do escambo à escravidão. 2. ed. São Paulo: Ed. Nacional, 1980.
MONTEIRO, John. Negros da terra. São Paulo: Companhia das Letras, 1994.
PERRONE-MOISÉS, Beatriz. “Índios livres e índios escravos: os princípios da legislação indigenista do período colonial (séculos XVI a XVIII)”. In: CUNHA, Manuela Carneiro da (Org.). História dos índios no Brasil. São Paulo: Companhia das Letras, 1992. p. 115-132.
SCHWARTZ, Stuart. “Uma geração exaurida: agricultura comercial e mão de obra indígena”; e “Primeira escravidão: do indígena ao africano”. In: ___. Segredos internos: engenhos e escravos na sociedade colonial, 1550-1835. São Paulo: Companhia das Letras, 1988.

Filme
Como era gostoso o meu francês (Nelson Pereira dos Santos, 1970)

Fonte: Revista de História da Biblioteca Nacional

terça-feira, 2 de julho de 2013

O mundo do trabalho


O trabalho surgiu com uma concepção  negativa. Sua origem latina o associa ao tripalium ( instrumento de tortura formado por três paus, ao qual eram atados os condenados). Dessa forma, o trabalho manual era desvalorizado na Antiguidade, e apesar do catolicismo tentar valoriza-lo na Idade Média, o colocando como uma ordenanca divina, ele continua sendo colocado em uma hierarquia inferior.

Na Idade Moderna com a Revolução Tecnológica ocorre uma valorização da técnica, da experimentação e do conhecimento alcançado por meio da prática. Com o nascimento da fábrica uma nova realidade se configura. Os trabalhadores foram obrigados a vender sua força de trabalho em troca de salário. Eles se submetidas às péssimas condições de vida e de trabalho, e aos poucos, a vender sua força de trabalho em troca de salário. Eles se submetem às péssimas condições de vida e de trabalho, e aos poucos a ideologia de que o trabalho dignifica o homem foi se formando.

Com a Revolução Industrial ocorre a divisão entre os donos dos meios de produção(os donos das fábricas, das máquinas) e os operários(o proletariado ). Tivemos nesse momento a separação entre quem cria, inventa o produto e quem é  obrigado a simplesmente e executar o trabalho. É a racionalização da produção , que acabou significando um controle maior nas etapas da produção e na divisão do trabalho .
Essa divisão do trabalho evoluiu até que Henry Ford introduziu a linha de montagem na indústria de automóveis, dando início ao Fordismo.Frederick Taylor também contribuiu para esse processo através de um método, o taylorismo, que visava o "aumento da produtividade com economia de tempo, onde até mesmos gestos e movimentos dos trabalhadores devem ser controlados para reduzir a perda de tempo. Em cada fábrica são criados cargos de gerentes e de fiscais dos trabalhadores, além de prêmio aos bons funcionários.

O resultado de todo esse processo é o que podemos chamar de alienação, ou seja, o produto do trabalho deixa de pertencer a quem o produziu e passa a ser do capitalista. "Ao se confinar o operário à fábrica são, retirando dele a posse do produto, é ele próprio que perde o centro de si mesmo. Não escolhe o salário, não escolhe o horário nem o ritmo de trabalho e passa a ser comandado de fora, por forças que lhe são estranhas".(p. 45)

As mercadorias se tornam um fetiche(passam a ser consideradas como se tivessem vida) e seu valor se torna maior do que o valor de uso. Pensamos no indivíduo que gasta metade do salário com um tênis,  pelo fato dele ser de determinada "marca". Além disso,  as pessoas se tornam coisas, já que os produtos e o mercado aparecem como mais importante. Se o empresário quer construir um hotel de luxo em um local onde há moradores pobres, ele não vai pensar no que é melhor para essas pessoas, mas sim usar todas as forças, inclusive a Administração Pública para tirá-los do local.

O trabalho aparece atualmente como o principal meio para o consumo, ou seja, não é o lugar de realização da vida ou do desenvolvimento das capacidades humanas, mas sim um meio para obtenção de um salário que possibilite o consumo. E o consumo alienante nos fornece a falsa ilusão de um pouco de felicidade.