quinta-feira, 28 de fevereiro de 2013

O Mundo de Sofia


O Mundo de Sofia é um romance escrito por Jostein Gaarder, publicado em 1991.Ele funciona tanto como romance, como um guia básico de filosofia. Veja abaixo o texto sobre o pensamento de René Descartes:

CAPÍTULO XVIII: DESCARTES
“... ele queria remover todos os velhos materiais do terreno de construção...”.

Alberto levantara-se e despira a capa vermelha. Pô-la numa cadeira e voltou a sentar-se confortavelmente no sofá.
- “René Descartes” nasceu em 1596 e viveu em vários países da Europa ao longo da vida. Já na sua juventude, sentia o forte desejo de tomar conhecimento da natureza do homem e do universo. Mas depois de ter estudado filosofia tornou-se consciente principalmente da sua própria ignorância.
- Mais ou menos como Sócrates?
- Sim, mais ou menos assim. Tal como Sócrates, estava convencido de que só a razão nos pode dar conhecimento seguro. Nunca podemos confiar no que está escrito em livros antigos. Nem sequer podemos confiar no que os nossos sentidos nos transmitem.
- Platão era da mesma opinião. Ele achava que só a razão nos pode dar um saber
sólido.
- Exato. De Sócrates e Platão, através de S. Agostinho, há uma linha direta até Descartes. Todos eles eram racionalistas convictos. Para eles, a razão era a única fonte segura de conhecimento. Após muitos estudos, Descartes reconheceu que não era forçoso confiar no saber transmitido na Idade Média.
Podes fazer uma comparação com Sócrates, que não confiava nas concepções mais difundidas com que se defrontava na ágora em Atenas. E o que é que se faz neste caso, Sofia? Sabes responder-me?
- Começa-se a filosofar por si mesmo.
- Exato. Descartes decidiu então viajar pela Europa - tal como Sócrates, que passou a vida em diálogo com homens de Atenas. Ele próprio relata que a partir dessa altura só queria procurar o saber que podia encontrar em si mesmo ou "no grande livro do mundo". Por isso, entrou para o exército e pôde permanecer em diversos locais da Europa Central. Mais tarde, passou alguns anos em Paris. Em Maio de 1629, viajou para os Países Baixos, onde viveu durante quase vinte anos, enquanto trabalhava nos seus escritos filosóficos. Em 1649, a rainha Cristina convidou-o a viver na Suécia. Mas esta estadia "no país dos ursos, do gelo e dos rochedos", como ele lhe chamou, provocou-lhe uma pneumonia, e morreu no Inverno de 1650.
- Então só tinha 54 anos!
- Mas ainda havia de ser muito importante para a filosofia, mesmo após a sua morte. Sem exagero, podemos dizer que Descartes foi o fundador da filosofia da época moderna. Depois da imponente redescoberta do homem e da natureza no Renascimento, surgiu de novo a necessidade de reunir todas as idéias contemporâneas num único “sistema filosófico” coerente. O primeiro grande construtor de sistema foi “Descartes”, e seguiramse- lhe “Espinosa” e “Leibniz”, “Locke” e “Berkeley”, “Hume” e “Kant”.
- O que é que entendes por "sistema filosófico"?
- Entendo uma filosofia construída desde a base e que procura encontrar uma resposta para todas as questões filosóficas importantes. A Antiguidade teve grandes construtores de sistemas como Platão e Aristóteles. A Idade Média teve S. Tomás de Aquino, que queria fazer uma ponte entre a filosofia de Aristóteles e a teologia cristã. Veio depois o Renascimento - com uma mistura de velhas e novas idéias sobre a natureza e a ciência, Deus e os homens. Só no século XVII a filosofia tentou de novo pôr em sistema as novas idéias. O primeiro a fazer esta tentativa foi Descartes. Ele deu o sinal de partida para aquilo que se tornaria o projeto filosófico mais importante para as gerações seguintes. Antes de mais, preocupava-o o que nós podemos saber, ou seja, a questão da “solidez do nosso conhecimento”. A segunda grande questão que o preocupava era a “relação entre corpo e alma”. Estas duas problemáticas determinariam a discussão filosófica dos cento e cinqüenta anos seguintes.
- Então ele estava adiantado em relação à época.
- Mas as questões já andavam no ar na época. Na questão de como podemos alcançar saber seguro, alguns exprimiram o seu total “ceticismo” filosófico. Achavam que os homens tinham de se conformar com o fato de nada saberem. Mas Descartes não se conformou com isso. Se o tivesse feito, não teria sido um verdadeiro filósofo. De novo, podemos fazer um paralelismo com Sócrates, que não se contentou com o ceticismo dos sofistas. Justamente na época de Descartes, a nova ciência da natureza desenvolvera um método que havia de fornecer uma descrição totalmente segura e exata dos processos naturais. Descartes se interrogou não havia um método igualmente seguro e Exato para a reflexão filosófica.
- Entendo.
- Mas esse era apenas um dos problemas. A nova física colocara também a questão sobre a natureza da matéria, ou seja, sobre o que determina os processos físicos na natureza. Cada vez mais pessoas defendiam uma compreensão materialista da natureza. Mas quanto mais o mundo físico era concebido de forma mecanicista, mais urgente se tornava a questão da relação entre corpo e alma. Antes do século XVII, a alma fora descrita geralmente como uma espécie de "espírito vital" que percorria todos os seres vivos. Aliás, o significado original de "alma" e "espírito" é também "sopro vital" ou "respiração". É esse o caso em quase todas as línguas européias. Para Aristóteles, a alma é algo que está presente em todo o organismo como "princípio vital" desse organismo - e que é inconcebível separada do corpo. Por isso também podia falar de uma "alma vegetativa" e de uma "alma sensitiva". Foi só no século XVII que os filósofos estabeleceram uma separação radical entre alma e corpo, porque todos os objetos físicos - também um corpo animal ou humano – eram explicados como processos mecânicos. Mas a alma humana não podia ser uma parte desta "máquina fisiológica"? O que era então? Tinha que se esclarecer como é que algo "espiritual" podia dar origem a um processo mecânico.
-Essa é realmente uma idéia bastante estranha.
- O que queres dizer com isso?
- Eu decido levantar o meu braço - e o braço eleva-se. Ou eu decido correr para o ônibus e imediatamente as minhas pernas começam a mover-se. Por vezes, penso numa coisa triste: as lágrimas vêm-me logo aos olhos. Assim, tem de haver alguma ligação misteriosa entre o corpo e a consciência.
- Foi precisamente este problema que levou Descartes a refletir. Tal como Platão, ele estava convencido de que há uma divisão rígida entre espírito e matéria. Mas Platão não conseguiu dar resposta ao problema de como o espírito influencia o corpo, ou a alma o corpo.
- Eu também não, por isso estou desejosa de saber o que Descartes descobriu. Ouçamos as suas próprias reflexões. Alberto indicou o livro que estava entre eles na mesa e prosseguiu:
- Neste pequeno livro, “Discurso do Método”, Descartes levanta a questão de qual o método filosófico que um filósofo deve utilizar para resolver um problema filosófico. As ciências da natureza já tinham desenvolvido o seu novo método...
-Já falaste nisso.
- Descartes explica em seguida que não podemos dar nada como verdadeiro enquanto não tivermos reconhecido claramente que é verdadeiro. Para conseguirmos isso, temos que decompor um problema complexo em tantas partes simples quanto possível. Podemos começar então pela idéia mais simples. Talvez se possa dizer que cada idéia é "pesada e medida" - mais ou menos do mesmo modo que Galileu queria medir tudo e tornar mensurável o não mensurável. Descartes achava que o filósofo podia prosseguir do simples para o complexo. Deste modo poderia ser construído um novo conhecimento. Até ao final, é necessário verificar que não se omitiu nada, por meio de um controlo e de uma verificação constantes. Só assim se pode atingir conclusões filosóficas.
- Isso parece um problema matemático.
- Sim, Descartes queria aplicar o "método matemático" à reflexão filosófica. Queria provar verdades filosóficas aproximadamente do mesmo modo que um teorema matemático. Queria usar exatamente o mesmo instrumento que usamos ao trabalhar com números, a “razão”, porque só a razão nos fornece conhecimento seguro. Não estabelece de modo algum que se possa confiar nos sentidos. Já referimos a
sua afinidade com Platão. Também este dissera que a matemática e as relações numéricas fornecem conhecimento mais seguro do que os testemunhos dos nossos sentidos.
- Mas é possível responder desse modo a questões filosóficas?
- Voltemos ao raciocínio de Descartes. O seu objetivo é, portanto, obter conhecimentos seguros acerca da natureza da realidade, e ele torna claro em primeiro lugar que no início devemos duvidar de tudo. Ele não queria edificar o seu sistema filosófico sobre areia.
- Porque se o fundamento cede, toda a casa se desmorona.
- Obrigado pela ajuda, Sofia. Descartes não achava sensato duvidar de tudo, mas
pensava que, em princípio, podemos duvidar de tudo. Em primeiro lugar, não é certo que
façamos progressos na nossa busca filosófica pela leitura de Platão ou Aristóteles. Talvez
alarguemos com isso o nosso saber histórico, mas não descobrimos mais acerca do mundo.
Descartes achava importante lançar ao mar o patrimônio intelectual antigo antes de iniciar a
sua própria investigação filosófica.
- Ele queria remover todos os velhos materiais do terreno de construção, antes de
iniciar a construção da nova casa?
- Sim, para ter a certeza de que o novo edifício de idéias era estável, ele queria usar
apenas material de construção novo e sólido. Mas as dúvidas de Descartes vão ainda mais
longe. Segundo ele, nunca podemos confiar no que os nossos sentidos nos transmitem,
porque podemos ser enganados por eles.
- Como é que isso é possível?
- Mesmo quando sonhamos, acreditamos estar a viver uma situação real. E haverá
alguma coisa que distinga as nossas sensações, quando estamos despertos, das sensações
"sonhadas"? "Quando reflito cuidadosamente nesta questão, não encontro nenhum indício
pelo qual possa distinguir com segurança a vigília do sono", escreve Descartes. E ele
prossegue: "São ambos tão semelhantes que eu fico totalmente perplexo e não sei se não
estarei a sonhar neste momento".
- Jeppe também achava que tinha sonhado ter estado deitado na cama do barão.
- E enquanto estava deitado na cama do barão achava que a sua vida como
camponês pobre era um sonho. Assim, Descartes duvida de tudo. Muitos filósofos antes
dele já tinham terminado as suas reflexões filosóficas neste ponto.
- Nesse caso, não foram muito longe.
- Mas Descartes tentou continuar a trabalhar a partir do zero. Ele chegou à
conclusão de que duvidava de tudo e que isso é a única coisa de que se pode ter uma
certeza absoluta. E em seguida, há algo que se lhe torna claro: há um fato, do qual ele pode
ter toda a certeza: duvida.
Mas se duvida, tem que concluir que pensa, e se pensa tem de concluir que é um
ser pensante. Ou, como ele próprio diz: "cogito, ergo sum".
-E o que significa?
- Penso, logo existo.
-Não me surpreende que ele tenha chegado a essa conclusão.
- Está bem. Mas não te esqueças com que certeza intuitiva ele se concebe
subitamente como um eu pensante.
Talvez ainda te lembres que para Platão é mais real o que compreendemos com a
razão do que o que obtemos dos sentidos. Com Descartes, passava-se exatamente o mesmo.
Ele não compreende apenas que é um eu pensante, entende simultaneamente que este eu
pensante é mais real do que o mundo físico, que apreendemos com os sentidos. E a partir
daqui, ele prossegue, Sofia. Ainda não concluiu de modo algum a investigação filosófica.
- Prossegue tu também com calma.
-Descartes interrogou-se então sobre se havia algo mais que ele pudesse apreender
com a mesma evidência intuitiva, além do fato de ser um ser pensante. Ele descobre que
tem também uma idéia clara e nítida de um ser perfeito.
Teve sempre essa idéia e, para Descartes, é evidente que essa idéia não pode provir
dele mesmo. A idéia de um ser perfeito não pode provir de um ser imperfeito. Por isso, a
idéia de um ser perfeito tem de provir desse mesmo ser perfeito -por outras palavras, de
Deus.
Que Deus existe é deste modo tão imediatamente evidente para Descartes como o
fato de alguém que pensa ter de ser um eu pensante.
- Agora, acho que ele precipita um pouco as conclusões. E era tão atento no
princípio!
- Sim, houve quem afirmasse ser este o ponto mais fraco de Descartes. Mas tu
estás a falar de deduções. Na verdade, não se trata aqui de uma demonstração. Descartes
queria apenas dizer que todos nós temos uma idéia de um ser perfeito, e que esta idéia
implica que este ser perfeito existe. Porque um ser perfeito não seria perfeito se não
existisse. Além disso, não teríamos a idéia de um ser perfeito se esse ser não existisse. Nós
somos imperfeitos e, por isso, a idéia do perfeito não pode provir de nós.
A idéia de um Deus é, segundo Descartes, uma idéia inata que nos foi implantada
ao nascermos - "tal como a marca que o artista imprimiu na sua obra", como ele escreve.
- Mas mesmo que eu tenha uma idéia de um crocofante, isso não significa que
existam crocofantes.
- Descartes teria dito que o conceito de "crocofante" não implica que ele exista.
Mas o conceito de "ser perfeito" implica que este ser exista.
Para Descartes isto é tão certo como o fato de a idéia de círculo implicar que todos
os pontos do círculo estão à mesma distância do centro do círculo. Logo, não podes falar de
um círculo se ele não preenche estes requisitos. E também não podes falar de um ser
perfeito se lhe falta a mais importante de todas as qualidades, a existência.
- É um modo de pensar muito especial.
- Isto é um modo de pensar claramente "racionalista".
Tal como Sócrates e Platão, Descartes via uma conexão entre pensamento e
existência. Quanto mais evidente uma coisa é para o pensamento, mais certa é a sua
existência.
- Até aqui, ele reconheceu que é um ser pensante, e que existe um ser perfeito.
- E, a partir destas certezas, prossegue. Todas as idéias que temos da realidade
exterior - por exemplo, Sol e Lua -, podiam também ser apenas visões oníricas. Mas a
realidade exterior também tem algumas características que podemos conhecer com a razão.
Por exemplo, as relações matemáticas, ou seja, aquilo que pode ser medido, o
comprimento, a altura e a profundidade. Estas “propriedades quantitativas” são tão claras
para a razão como o fato de eu ser um ser pensante. “Propriedades qualitativas” como cor,
cheiro e sabor estão por seu lado relacionadas com os nossos sentidos e não descrevem
nenhuma realidade exterior.
- Então afinal a natureza não é um sonho?
- Não. E, neste ponto, Descartes recorre novamente à nossa idéia de um ser
perfeito. Se a nossa razão conhece algo muito clara e distintamente -que é o caso das
relações matemáticas na realidade exterior - é porque é assim mesmo. Um Deus perfeito
não faria pouco de nós.
Descartes recorre a Deus como garantia de que aquilo que conhecemos com a
nossa razão corresponde a uma coisa real.
- Está bem. Ele descobriu que é um ser pensante, que Deus existe e ainda que
existe uma realidade exterior.
- Mas entre a realidade exterior e a realidade das idéias há uma diferença essencial.
Descartes pressupõe que existem duas formas diferentes de realidade - ou duas
“substâncias”. Uma substância é o “pensamento” ou a alma, a outra a “extensão” ou a
matéria.
A alma é apenas consciente, não ocupa espaço e, por isso, também não pode ser dividida em partes menores. A matéria, por seu lado, é extensa, ocupa espaço e pode ser
dividida em partes cada vez menores - mas não é consciente. Descartes afirma que ambas
as substâncias provêm de Deus, porque apenas Deus existe independentemente de todas as
outras coisas.
Mas mesmo provindo pensamento e extensão de Deus, as duas substâncias são
completamente independentes uma da outra. O pensamento é livre na sua relação com a
matéria - e vice-versa: os processos materiais operam de forma totalmente independente do
pensamento.
-E assim, a Criação ficou dividida em dois.
- Exato. Dizemos que Descartes é “dualista”, e isso significa que ele traça uma clara
linha de separação entre a realidade espiritual e a realidade em extensão. Por exemplo,
apenas o homem tem alma. Os animais pertencem totalmente à realidade em extensão. A
sua vida e os seus movimentos são puramente mecânicos. Descartes via os animais como
uma espécie de autômatos complexos. Em relação à realidade em extensão, ele tem dela
uma concepção mecanicista - tal como os materialistas.
- Mas eu duvido muito que Hermes seja uma máquina ou um autômato. Certamente,
Descartes nunca gostou de um animal. E em relação a nós? Também somos autômatos?
-Sim e não. Descartes chegou à conclusão de que o homem é um ser duplo que
pensa e ocupa espaço. O homem tem uma alma e um corpo extenso.
S. Agostinho e S. Tomás de Aquino já tinham afirmado algo semelhante.
Acreditavam que o homem tem corpo tal como os animais, mas também espírito como os
anjos. Para Descartes, o corpo é um mecanismo muito sofisticado. Mas o homem tem
também alma que pode operar independentemente do corpo. Os processos corporais não
têm essa liberdade, seguem as suas próprias leis. Mas aquilo que pensamos com a razão não
acontece no corpo.
Acontece na alma, que é independente da realidade extensa. Eu posso ainda
acrescentar que Descartes não queria excluir a possibilidade de também os animais
pensarem. Mas, se possuírem essa faculdade, também tem de existir neles a mesma divisão
entre pensamento e extensão.
- Já falamos sobre isso.
Quando eu decido correr para o ônibus, todo o "autômato" se põe em movimento.
E se perco o ônibus, vêm-me as lágrimas aos olhos.
- Nem Descartes podia contestar que existe sempre esse efeito recíproco entre alma
e corpo. Enquanto a alma está no corpo, segundo ele, está ligada ao corpo através de um
órgão do cérebro muito especial, uma glândula, na qual se dá uma reação constante entre o
espírito e a matéria. Deste modo, segundo Descartes, a alma pode ser permanentemente
confundida com os sentimentos e sensações que têm a ver com as necessidades do corpo. O
objetivo é transmitir à alma a ordem:
Seja qual for a gravidade das minhas dores de barriga, a soma dos ângulos num
triângulo é sempre cento e oitenta graus. Deste modo, o pensamento pode elevar-se acima
das necessidades do corpo e proceder "racionalmente". Deste ponto de vista, a alma é
totalmente independente do corpo. As nossas pernas podem ficar velhas e fracas, as nossas
costas tortas, e os nossos dentes podem cair - mas dois mais dois serão sempre quatro,
enquanto ainda houver razão em nós. Porque a razão não fica velha e caduca. Os nossos
corpos é que envelhecem. Para Descartes, a própria razão é a alma. Paixões e humores
inferiores como a concupiscência e o ódio estão estreitamente ligados às funções corporais
- e conseqüentemente à realidade extensa.
- Eu não me conformo com o fato de Descartes ter comparado o corpo com uma
máquina ou um autômato.
- O motivo da comparação é o fato de as pessoas, no tempo de Descartes, estarem
completamente fascinadas com as máquinas e os mecanismos dos relógios, que
aparentemente funcionavam por si mesmos. A palavra "autômato" designa precisamente
algo que se move por si mesmo. Mas eles moverem-se por si era apenas uma ilusão. Por
exemplo, os homens construíram nessa época um relógio astronômico e deram-lhe corda.
Descartes acentua que estes mecanismos artificiais são compostos muito simplesmente por
poucas partes, em comparação com as quantidades de ossos, músculos, nervos, artérias e
veias que compõem os corpos de homens e animais. Mas porque é que Deus não havia de
produzir um corpo animal ou humano com base nas leis mecânicas?
- Hoje fala-se muito de "inteligência artificial".
- Estás a pensar nos nossos autômatos atuais. Construímos máquinas que por vezes
nos podem convencer realmente da sua inteligência. Essas máquinas teriam certamente
posto Descartes em pânico.
Talvez ele se interrogasse se a razão humana é realmente tão livre e autônoma
como ele tinha pensado. Há filósofos que pensam que a vida espiritual humana é tão pouco
livre como os processos corporais. A alma de um homem é infinitamente mais complexa do
que qualquer programa de computador, mas há também quem pense que em princípio
somos tão pouco livres como esses programas. "

Se gostou e quer ler o livro, baixe aqui e boa leitura.

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